21 de dezembro de 2009

O Boto Rosa Emo


Nos confins do Brasil fala-se do Boto Rosa. Mamífero festeiro, adorador da lua. Sapato mocassim preto e branco, terno de linho de corte elegante. Chapéu Panamá para esconder o imenso nariz. Namorador. Gosta de boa prosa, cerveja gelada. Meia hora de conversa e as menininhas já estão no papo. Aí é só levar para conhecer o fundo do rio.

Mas as coisas já não são mais as mesmas. O excesso midiático provoca mutações, inclusive no famoso Boto. A TV está por toda parte, até na mais distante maloca. Conta-se que o mamífero namorador mudou de nome, segundo uma garota que se apaixonou perdidamente. Eis o depoimento da pobre indiazinha:

Estava com umas amigas numa festa. A animação era geral: música, dança e bebida. NX Zero badalava no volume máximo! Luzes néon, fumaça de gelo seco... tudo perfeito. Eu usava minha melhor saia. Feita de taboca importada de Guiné-Bissau, conchas gregas e sementes vindas exclusivamente da Terra-Média. Naquela noite decidi que encontraria meu príncipe encantado. E ele apareceu. Como nos contos de fadas. A cortina de fumaça dava certo ar de mistério, um smog londrino. Um vulto caminhava lentamente em minha direção. Calça e camisa preta com um desenho de coração flechado colada ao tórax perfeitamente esculpido em horas e mais horas de academia, tênis All Star de cano longo. Olhei para seu rosto. Uma imensa franja cobria da testa ao queixo. Meu Deus! Era lindo. Aquele ar de mistério e sedução gerou uma onda de arrepios em meu corpo. Nunca havia experimentado tal sensação. Teria sido um orgasmo? Mas nem tocar ele me tocou! Passou por mim, balançou a cabeça para ajeitar a franja que encobria seus olhos. Qual seria a cor daqueles olhos? Não me contive e o segui. Ele debruçou-se sobre o balcão e chamou o garçom. Imaginei que ele pediria uma tequila, uma cachaça ou até mesmo uma cerveja gelada, mas não. Ele pediu um copo de duplo de suco de açaí. Sem açúcar. Tomou como se fosse uma loira gelada após meia de hora de futebol sob o sol do verão tropical. Meu Deus! Não acreditei. Era tudo que sempre quis: um homem que não bebe, que não joga futebol e provavelmente não fala palavrões. Um príncipe na sua mais pura síntese. Me aproximei. Sentia seu perfume, um tanto quanto adocicado, mas aquilo era provavelmente um erro grosseiro do meu olfato sensível e nas condições em que me encontrava, já não respondia mais pelos meus atos. Toquei em seus ombros e ele olhou assustado. Parecia ter visto um fantasma. Disse apenas um oi com uma voz rouca e sensual. Pensei em agarrá-lo, mas me contive. Usei todo o meu charme, puxei conversa, ofereci uma bebida e nada... Por fim, já desistindo do meu encantado, perguntei seu nome, disse-lhe que sairia imediatamente após a resposta. O sorriso que se seguiu foi o mais lindo que já vi. Ele olhou bem dentro dos meus olhos e disse: eu sou o famoso Pink Dolphin. Nunca ouviu falar? Me senti a mais ignorante das mortais, não sabia quem era. Seria um novo astro do cinema ou da música pop? Logo eu que sempre fui antenada. Não, nunca ouvi falar, respondi-lhe. E a gargalhada que se sucedeu me fez perder o encanto. Não sei como classificar aquilo, era uma mistura de bateria de escola de samba com uma arara enlouquecida. E ele ainda com o sorriso nos lábios disse: Sou o arcaico, ultrapassado, démodé Boto Rosa, querida.
P.S. Continho bobo escrito com o intuito de brincar com a "onda emo" que virou mania. Até vampiros emos existem...
P.S. 2 Não curto NX Zero nem suco de açaí. Hhehehe!